segunda-feira, 9 de agosto de 2010

INSCRIÇÃO PARA UM PORTÃO DE CEMITÉRIO



Na mesma pedra se encontram,
Conforme o povo traduz,
Quando se nasce - uma estrela,
Quando se morre - uma cruz.
Mas quantos que aqui repousam
Hão de emendar-nos assim:
"Ponham-me a cruz no princípio...
E a luz da estrela no fim!"

sexta-feira, 16 de julho de 2010

As flores


Poesia - As flores
I
Deus ao mundo deu a guerra,
A doença, a morte e as dores.
Mas para alegrar a terra.
Basta haver dado as flores.
II
Amai as flores crianças
Sois irmãs nos esplendores
Porque há muita semelhança
Entre as crianças e flores
III
Umas, criadas com arte
Outras, simples e modesta
Há flores por toda a parte
Nos enterros e nas festa
IV
Nos jardins, nos cemitérios
Nos pauis e nos pomares
Sobre os jazigos funéreos
Sobre o berço e nos altares.
V
Reina a flor, pois quis a sorte
Que a flor, a tudo presida
E também enfeita a morte
Assim como enfeita a vida.

Garça triste


"Eu sou como a garça triste
"Que mora à beira do rio,
"As orvalhadas da noite
"Me fazem tremer de frio.

"Me fazem tremer de frio
"Como os juncos da lagoa;
"Feliz da araponga errante
"Que é livre, que livre voa.

"Que é livre, que livre voa
"Para as bandas do seu ninho,
"E nas braúnas à tarde
"Canta longe do caminho.

"Canta longe do caminho.
"Por onde o vaqueiro trilha,
"Se quer descansar as asas
"Tem a palmeira, a baunilha.

"Tem a palmeira, a baunilha,
"Tem o brejo, a lavadeira,
"Tem as campinas, as flores,
"Tem a relva, a trepadeira,

"Tem a relva, a trepadeira,
"Todas têm os seus amores,
"Eu não tenho mãe nem filhos,
"Nem irmão, nem lar, nem flores".

«Castro Alves (1847-1871) foi um dos poetas Brasileiros do século XIX que voou mais alto nas asas da poesia , apesar de ter partido do mundo dos vivos apenas com 24 anos de idade. Tuberculoso no começo da juventude, viveu cada dia da vida como se fosse o último.» Lição de vida para muita gente

quinta-feira, 15 de julho de 2010

A mulher que passa - Vinícius de Moraes



Meu Deus, eu quero a mulher que passa
Seu dorso frio é um campo de lírios
Tem sete cores nos seus cabelos
Sete esperanças na boca fresca!
Oh! como és linda, mulher que passas
Que me sacias e suplicias
Dentro das noites, dentro dos dias!


Teus sentimentos são poesia
Teus sofrimentos, melancolia.
Teus pelos leves são relva boa
Fresca e macia.
Teus belos braços são cisnes mansos
Longe das vozes da ventania.


Meu Deus, eu quero a mulher que passa!


Como te adoro, mulher que passas
Que vens e passas, que me sacias
Dentro das noites, dentro dos dias!
Por que me faltas, se te procuro?
Por que me odeias quando te juro
Que te perdia se me encontravas
E me concontrava se te perdias?


Por que não voltas, mulher que passas?
Por que não enches a minha vida?
Por que não voltas, mulher querida
Sempre perdida, nunca encontrada?
Por que não voltas à minha vida
Para o que sofro não ser desgraça?


Meu Deus, eu quero a mulher que passa!
Eu quero-a agora, sem mais demora
A minha amada mulher que passa!


Que fica e passa, que pacífica
Que é tanto pura como devassa
Que bóia leve como a cortiça
E tem raízes como a fumaça.

Vinícius de Moraes

Alma perdida - Florbela Espanca



Toda esta noite o rouxinol chorou,
Gemeu, rezou, gritou perdidamente!
Alma de rouxinol, alma da gente,
Tu és, talvez, alguém que se finou!

Tu és, talvez, um sonho que passou,
Que se fundiu na Dor, suavemente...
Talvez sejas a alma, a alma doente
Dalguém que quis amar e nunca amou!

Toda a noite choraste... e eu chorei
Talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei
Que ninguém é mais triste do que nós!

Contaste tanta coisa à noite calma,
Que eu pensei que tu eras a minh'alma
Que chorasse perdida em tua voz!...


Florbela Espanca

Em poucas palavras...


Saibam quantos este meu verso virem
Que te amo
DO amor maior
Que possível for..."

Oswald de Andrade

Soneto Do Amor Total - Vinicius de Moraes



Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pud